Os zumbis que conhecemos na ficção científica são pós-humanos ferozes que se alimentam de carne. Enquanto essas histórias nunca viraram realidade, a natureza está cheia de casos de zumbificação entre plantas e animais. Às vezes, os paralelos são impressionantes.
Há algo assustador na ideia de que o comportamento de um animal possa ser drasticamente transformado por uma infecção ou um parasita, mas é um fenômeno bastante consagrado na natureza.
Foram encontrados até mesmo fósseis com evidências de formigas zumbis que datam de 48 milhões de anos atrás.
Conheça os zumbis da vida real, alguns deles mais estranhos que a ficção:
Formigas zumbis
Há alguns anos, Matt Fisher fazia uma pesquisa de campo à noite nas densas florestas da Guiana Francesa quando se deparou com algo surpreendente. "Encontramos cadáveres de insetos que haviam sido parasitados fixados no alto da vegetação, com corpos cheios de esporos sendo projetados para fora de seus crânios", lembra ele.
Fisher, epidemiologista de doenças fúngicas do Imperial College London, sabia exatamente do que se tratava: restos mortais das "formigas zumbis", insetos infectados com um parasita fungal que controla seus corpos e mentes, fazendo elas rastejarem sobre plantas, onde ficam presas. Quando elas morrem, os esporos fúngicos infeccionados caem sobre outras formigas abaixo delas, espalhando ainda mais o contágio.
Se os zumbis da ficção frequentemente espalham suas infecções por mordidas, essas formigas se fixam a plantas de uma maneira parecida. Às vezes elas se prendem às folhas com suas mandíbulas e morrem com a trinca intacta.
O grupo de fungos que consegue fazer isso pertence ao gênero Ophiocordyceps. Uma vez infectada, a formiga zumbi irá rastejar até um tipo específico de locação determinada pela espécie de fungo que a vitimou.
Talvez o fungo mais famoso, Ophiocordyceps unilateralis, deixe sua hospedeira morrer empoleirada sob uma folha.
A maneira como um fungo pode exercer esse efeito específico em um organismo tão mais complexo que o seu não é óbvia. Mas os cientistas David Hughes, Harry Evans e seus colegas tentam resolver o mistério - eles têm estudado fungos cordyceps por décadas. Descobriram que espécies diferentes de Ophiocordyceps unilateralis evoluíram para combinar com os diferentes ciclos de vida de qualquer espécie de formiga hospedeira que eles usarem como vítima. É um "impressionante exemplo de coevolução", diz Evans.
Em um artigo de 2016, Evans e seus coautores explicaram que o fungo provavelmente usa uma série de enzimas que alteram processos no corpo da formiga hospedeira. Essas enzimas podem, por exemplo, mudar a expressão dos genes de uma maneira que influencie o comportamento das formigas.
Também se sabe que, uma vez que elas são "zumbificadas", o tecido muscular das formigas cede gradualmente.
Também pode haver manipulação direta do sistema nervoso da formiga e controle de neurotransmissores de "mensageiros químicos" como a dopamina - o que também pode modificar o comportamento dos animais. Essas interações ainda não são completamente compreendidas. O que está claro é que mais exemplos de insetos-fungos zumbis ainda estão sendo descobertos.
"A próxima questão que estamos tentando descobrir é se a mesma coisa acontece com aranhas", diz Evans. "E a resposta parece ser sim".
Esses zumbis da vida real até influenciam a representação de zumbis na ficção. Conforme eles foram ficando mais conhecidos, os fungos cordyceps inspiraram fábulas modernas sobre os mortos-vivos. Por exemplo, no romance de M. R. Carey, A menina que tinha dons, e no videogame The Last of Us, as vítimas humanas são infectadas por um fungo parasita, não um vírus zumbi.
Parasitas zumbis
A situação na qual as vidas dos dois organismos estão diretamente ligadas - como quando há um parasita e seu hospedeiro - é conhecida como simbiose. No mundo dos insetos, há vários exemplos disso.
Tome como exemplo a vespa parasita Glyptapanteles, que põe seus ovos no corpo de lagartas. Quando os ovos se partem, as larvas de vespa se alimentam dos fluidos corporais da lagarta antes de formar um casulo nas proximidades.
Mas a lagarta, apesar de ser prejudicada pelo processo, continua viva e em posição de uma espécie de segurança zumbi que espanta agressivamente besouros que se aproximam e poderiam se alimentar dos casulos. Os pesquisadores que estudam esse comportamento descobriram que, com uma segurança-lagarta perto, o número de predadores que se aproximam dos casulos pode ser diminuído em uma óbvia vantagem de sobrevivência.
O termo parasitoide significa um parasita que pode matar seu hospedeiro em algum momento. Há vários exemplos de vespas parasitoides que influenciam o comportamento dos hospedeiros de maneiras cruéis.
Kelly Weinersmith, ecologista da Universidade de Rice, estudou um exemplo macabro em 2017. Ele ficou conhecido como a vespa guarda-criptas, ou Euderus set.
Essa vespa parasitoide espera que outras espécies de vespas parasitem uma árvore ao depositar seus ovos para atacá-las.
A descoberta foi festa depois que Scott Egan, colega de Weinersmith, descobriu uma cripta de vespa parasita fora do comum enquanto passava as férias com a família. Nesse caso, a cripta havia sido criada por uma espécie de vespa chamada Basettia pallida.
Geralmente, a B. pallida faria a incubação de seus ovos e em algum momento um buraco na cripta antes de voar para longe. Mas com a guarda-cripta à solta, seu destino não é tão certo. Isso é porque a Euderus deposita seu ovo dentro da cripta.
"Nós não sabemos os mecanismos através dos quais ela faz isso, mas faz com que a primeira vespa que estava no local crie um buraco de emergência", diz Weinersmith. "Só que o buraco é menor que o comum e em vez de sair, sua cabeça fica presa e ela morre ali dentro".
A vespa guarda-cripta agora está no comando. Ela come a vespa que morreu presa para se manter enquanto cresce. "Quando termina de se desenvolver, ela sai pela cabeça de sua hospedeira", diz Weinersmith.
Então a parasita gera uma parasita. A primeira vespa, B. pallida, ela mesma uma parasita da árvore, foi transformada em uma espécie de zumbi suicida - e uma fonte de nutrição para seu próprio parasita, o guarda-cripta. Os dois casos individuais de controle aqui, um dependente do outro, faz desse caso um raro exemplo de hipermanipulação, diz Weinersmith.
Zumbis sexuais
Se um zumbi é um organismo cujo comportamento é drasticamente modificado para beneficiar seu parasita, então outro exemplo bizarro disso pode ser encontrado nas pererecas japonesas da Coreia do Sul.
Em março de 2016, Bruce Waldman, da Universidade Nacional de Seul, e seu aluno Deuknam An publicaram evidências de uma extraordinária manipulação comportamental causada por um fungo patogênico, Batrachochytrium dendrobatidis.
O fungo é uma ameaça conhecida para muitas espécies de sapos, mas as pererecas japonesas na Ásia não parecem morrer tão abruptamente quando uma população é infectada. Quando Waldman e Na escutaram os sons reprodutivos de 42 sapos machos, perceberam que os nove que foram infectados com Batrachochytrium dendrobatidis emitiam sons mais rápidos e longos - tornando-os mais atraentes para cruzas em potencial.
"Ainda assim, não podemos dizer com certeza se as diferenças no chamado são atribuíveis aos fungos manipulando o hospedeiro", diz Waldman. Poderia ser, por exemplo, devido a outra reação que os sapos podem ter devido à infecção.
Matt Fisher diz que os anfíbios podem ser transformados em "zumbis sexuais", cujas interações subsequentes com cruzas apenas aumentam a possibilidade de os fungos se espalharem ainda mais. "Não é uma hipótese comprovada, mas os indícios são fortes", diz.
Plantas zumbi mutantes
Talvez um dos exemplos mais surpreendentes na natureza de um zumbi da vida real esteja fora do reino animal, nas plantas que são transformadas em versões mutantes de si mesmas.
Saskia Hogenhout, do Centro John Innes, e seus colegas descobriram o mecanismo pelo qual um grupo de bactérias, chamado de fitoplasma, transforma plantas impotentes em zumbis. Eles publicaram sua pesquisa em 2014.
A bactéria em questão precisa ser espalhada por insetos que se alimentam da seiva das plantas, como as cigarrinhas. Mas, para atrair esses veículos de contágio, plantas infectadas precisam ceder às bactérias.
"Parece que esses parasitas estão dominando outras plantas", diz Hogenhout.
Hogenhout e sua equipe descobriram que a bactéria estava secretando proteínas que alteram processos moleculares dentro das plantas. Ou seja, eles alteram fatores de transcrição: as próprias proteínas da planta que controlam a expressão do gene e ajudam a diferenciar várias partes do organismo, como uma folha de uma flor ou de um caule.
As proteínas invasivas da bactéria deslocam as das plantas em um nível em que a planta infectada começa a se transformar. As flores da planta começam a morfar em flores verdes, tornando-se folhas. A infecção as torna mais atraentes para os insetos que vão colher a bactéria e carregá-las para novos hospedeiros de plantas.
"Ficou bastante claro que o parasita está interferindo em processos bastante essenciais da planta e mudando a identidade delas - é basicamente o que um zumbi faz", diz Hogenhout. "Elas estão usando outra identidade".
As plantas zumbis são um exemplo especialmente interessante porque a própria planta não morre como resultado da infecção. Ela simplesmente é transformada em um veículo útil para ainda mais contágio. Como o biólogo Jon Dinman, da Universidade de Maryland, afirma, algumas infecções bem-sucedidas estilo zumbi mantêm o hospedeiro vivo.
Em geral, a doença é transmitida entre organismos quando sua virulência - sua habilidade de prejudicá-los - é colocada em xeque. É exatamente isso o que acontece com as plantas zumbis, por exemplo.
Felizmente, os humanos não são ameaçados por esses patogênicos.
O mesmo não pode ser dito a respeito de muitos insetos e outros organismos, porém. Em florestas no mundo todo, os hospedeiros zumbis já estão soltos, suas mentes e corpos torcidos sob o efeito de parasitas espetaculares.
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